PARADIGMAS, |
UMA
QUESTÃO DE
PRINCÍPIOS |
Se
esperamos, a partir de um paradigma, uma certa resposta,
torna-se necessário obtê-la manipulando as hipóteses
de partida.
... A ciência não é um jogo inocente
Jorge Buescu, Prefácio, CAOS
...
pensámos contra a Natureza,
certos de que a nossa missão é dominá-la,
subjugá-la, conquistá-la
Edgar Morin, O Paradigma Perdido
...Quem
cria a dualidade
não realizará o despertar semelhante ao espaço
O Rei que criou tudo, Introduction au Dzogchen
As
mudanças de paradigma podem ser vistas como o eixo em torno
do qual evoluem as ciências: à medida que novas teorias
se instalam, substituíndo parcial ou totalmente as anteriores,
profundas diferenças de filosofia, perspectiva e linguagem
vão-se insinuando, provocando rupturas epistemológicas,
consolidando novas visões e orientações (sobre
este tema pode ver várias das obras referenciadas na bibliografia,
entre outras).
O
real em evolução - do qual cada ciência se
quer aproximar, descrevendo-o e explicando-o de forma progressivamente
mais fiel - é um dos presumíveis responsáveis
por estas mudanças de paradigma. E se o conhecimento científico
se desenvolve (isto é, cresce, aprende, transforma-se)
como um sistema adaptável complexo, também é
natural que esta mudança geral, este pôr um tipo
diferente de barrete pensante que é a mudança de
paradigma, seja ao mesmo tempo ruptura e continuidade (tal como
uma idosa é diferente da criança que já foi
e que de algum modo faz parte do seu ser de hoje; ou tal como
cada revolução tem de ser entendida como reacção
ao contexto que a precedeu).
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Podemos
definir paradigma de diferentes formas: como o modelo
conceptual que dirige os discursos; como o padrão
que têm em comum variadas perspectivas; como
o esquema em que se arrumam as visões e questões
de princípios;... Para a presente reflexão,
basta reter a ideia de paradigma como a estrutura,
quase sempre implícita (invisível),
em que assentam as construções científicas
e também sociais.
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Uma
teoria identifica regularidades e ou propôe explicações
para ela, ou deixa as explicações em aberto (ver
O Quark e o Jaguar). Vista deste ângulo, e de longe, a produção
cientifíca é uma versão sistemática
e sistematizada do conhecer para sobreviver dos humanos, isto
é, dos nossos esforços quotidianos de emersão,
de conhecimento por observação, comparação,
abstração, análise ou sintese, tentando separar
o fortuito das regularidades, generalizando, reformulando para
percebermos as coisas e acontecimentos, os outros, nós
próprios; para levarmos a nossa vida o melhor possível.
Assim,
não parece necessário nem conveniente fazer demasiada
cerimónia na aproximação a conhecimento produzido
por diferentes áreas cientificas; até porque muitos
cientistas, hoje em dia, escrevem fascinantes livros de divulgação
que nos ajudam a perceber questões de fundo (mas também
a perceber que nem fazemos uma ideia da complexidade das técnicas
e dos procedimentos necessários a essa produção
cientifica; tal como, aliás, os outros profissionais não
fazem uma ideia da complexidade teórica, técnica
e prática da intervenção social).
Temos
hoje oportunidade de perceber, no geral, algumas das questões
que mobilizam as diferentes ciências; porém, a bem
do rigor, a apropriação e a utilização
de produção científica já são
questões de uma ordem diferente, em que é muito
provável que todas as cautelas sejam úteis.
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Estas
reflexões são um aviso à navegação,
prévio à leitura das ideias, considerações
e hipóteses que se seguem e que por vezes partem
de campos fascinantemente distantes, para chegarem à
intervenção social.
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Se
"a ciência não é um jogo inocente"
(Caos, prefácio por Jorge Buescu), a prática reflexiva
também não o é... A possibilidade de refutação
de uma teoria, bem como de qualquer das nossas ideias, está
de facto sempre em aberto - o que não é nada confortável,
porque "a partir de um certo momento, em relação
às nossas ideias desenvolvemos fé, e depois amor",
como diz Edgar Morin... Mas o conhecimento cresce como um sistema
adaptável complexo e é capaz de aprender até
com estas mesmas dificuldades, resultantes da curiosa forma como
o eu-humano está construído.